O Gás Natural, conhecido por sua sigla GN, é o combustível que apresentará o maior crescimento mundial de demanda nas próximas décadas. A justificativa é clara: sua baixa pegada de carbono o elegeu como energético de transição para substituir paulatinamente os óleos combustíveis e o carvão mineral até que a oferta de energia limpa (renovável) possa atender à demanda. Estudos globais como o da IEA (International Energy Agency) preveem um aumento da participação do GN na matriz energética mundial, independentemente do cenário considerado, pelo menos até 2040.
No Brasil, é esperado o aumento da oferta do GN como consequência direta da exploração e produção das jazidas do pós-sal e do pré-sal.
O gás natural distribuído no Brasil é proveniente de várias fontes: poços “onshore” e “offshore” de gás associado ou não associado ao petróleo, tanto do pós-sal como do pré-sal, após passar pelas Unidades de Processamento de Gás Natural (UPGNs); importação da Bolívia através do gasoduto Gasbol; importação por navios no estado criogênico, o Gás Natural Liquefeito (GNL), passando por sistema de regaseificação para transporte por gasodutos; e gás oriundo de aterros sanitários e estações de tratamento de esgoto após sua purificação e compressão, denominado biometano, desde que esteja em conformidade com a Resolução ANP nº 685/2017, podendo até ser injetado nos gasodutos de GN.
A principal distribuição do GN é feita através de gasodutos de transporte no estado gasoso e em elevadas pressões. Suas derivações alimentam os “city-gates” onde é feita a transferência de custódia para as distribuidoras que, por sua vez, distribuem o gás através dos gasodutos de distribuição em médias pressões. Existe ainda no Brasil uma empresa que liquefaz o gás retirado do gasoduto, denominado GNL e o distribui por carretas criogênicas. Outra modalidade secundária é sua distribuição no estado comprimido (GNC) em cilindros de altas pressões. As modalidades GNL e GNC são alternativas para o fornecimento em regiões onde não haja redes de distribuição, competindo diretamente com o GLP.
As aplicações do GN abrangem um amplo mercado industrial, comercial e residencial como fonte de calor, incluindo ciclos de refrigeração por compressão e absorção, geração de energia elétrica podendo estar acompanhada de cogeração e trigeração, além do uso veicular (GNV). O GN pode ainda ser usado como matéria-prima para a indústria petroquímica na produção de plásticos, metanol, fibras sintéticas, borracha e para indústria de fertilizantes, produzindo ureia, amônia e derivados. O GN possibilita ainda a produção de combustíveis líquidos de alta qualidade através do processo denominado GTL - Gas-to-Liquids, através da Síntese Fischer-Tropsch.
As especificações do gás natural estão estabelecidas na Resolução ANP nº 16, de 17/06/2008, e em seu anexo Regulamento Técnico ANP nº 2/2008. Esta Resolução
estabelece que a composição do GN apresente um teor elevado de metano, acompanhado de etano (máx. 12%), outros
gases combustíveis em baixas percentagens como propano, butano e mais pesados, além de gases inertes (gás carbônico e nitrogênio) e traços de oxigênio. O teor de enxofre total máximo é muito baixo, não ultrapassando 70 mg/m³.
A Tabela 1 mostra os valores médios das principais características do GN nas condições indicadas. Cabe destacar que a escolha do poder calorífico a ser adotado, superior ou inferior, dependerá das condições da sua aplicação. Em quase a totalidade dos casos deverá ser considerado o poder calorífico inferior, pois não se aproveita a energia da condensação do vapor d’água gerado pela queima do hidrogênio contido no gás. O uso do poder calorífico superior só se justifica em processos especiais como aquecedores de condensação. Esta figura indica ainda que se trata de um gás combustível mais leve do que o ar, portanto em caso de vazamento existe a tendência inicial desse fluxo em trajeto ascendente, acabando por formar uma mistura perfeita no volume da atmosfera que o contem.
A Tabela 2 mostra a sequência de temperaturas que separam os estados sólidos, líquidos e gasosos dos principais componentes do GN. O ponto de fulgor (ou ponto de inflamação) é a temperatura na qual um combustível libera a quantidade mínima suficiente de gás para formar uma mistura inflamável com o ar na superfície do combustível, ocorrendo apenas um “flash” na presença de uma condição de ignição - não havendo quantidade suficiente para manter a combustão. No caso do metano destaca-se seu ponto de fulgor, o qual ocorre quando este gás ainda se encontra no estado sólido, havendo a liberação do vapor devido à sublimação. Em quase a totalidade dos combustíveis, o ponto de fulgor ocorre entre o ponto de fusão e o ponto de ebulição, ou seja, por evaporação partindo do estado líquido.
A temperatura crítica serve para definir a fronteira entre gás e vapor. Abaixo da temperatura crítica a substância é um vapor, ou seja, pode permanecer no estado líquido mediante conjugações de valores de pressão e temperatura, como no caso do propano e do butano, principais constituintes do GLP, onde as temperaturas críticas estão muito acima daquelas encontradas na atmosfera do nosso planeta. Já o metano faz com que o gás natural esteja mesmo no estado gasoso, pois sua temperatura crítica é - 82,6°C, muito abaixo das condições atmosféricas; portanto em temperaturas acima deste valor não é mais possível liquefazer este gás apenas mediante pressão.
Pode-se concluir que o gás natural, assim como o GLP relatado na edição anterior, é um combustível ambientalmente amigável e sua participação na matriz energética mundial deverá aumentar nas próximas décadas. O GN pode ainda participar como matéria-prima do processo GTL.
Referências
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- CORNFORTH, J.R., Combustion Engineering and Gas Utilisation,
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- JENKIN, D.B., The Properties of Liquefied Petroleum Gases,
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